segunda-feira, 23 de abril de 2012

dia mundial do Livro - Os Grandes Cinco (II)


Os livros podem ser divididos em 2 grupos: aqueles do momento e aqueles de sempre. 
John Ruskin


Tive a sorte de entrar no sui generis mundo de Franz Kafka da melhor maneira possível. Lendo a Metamorfose.
Se a entrada tivesse sido feita por qualquer outro livro dele, provavelmente a esta hora O Processo não seria um dos Grandes Cinco da minha vida.

A Metamorfose é um livro "levezinho". Quem gostar deste livro arrisco-me a dizer que gosta de Kafka. Todas as características dele estão presentes.
O absurdo da situação, a impessoalidade e desumanização do ambiente que o rodeia, alterações de comportamentos, conflitos existenciais, a solidão, o que fazer e para onde ir.

Depois de se gostar de Metamorfose pode-se partir para as outras obras kafkianas. Foi o que fiz. O Processo foi o segundo livro que li dele.

O Processo conta a história de um individuo chamado Joseph K que a determinado ponto da sua vida é processado.
Joseph é bancário. Tem uma boa posição, é dedicado e é um funcionário exemplar.
Na manhã em que faz 30 anos ele é preso.

Desconhece em absoluto o porquê da sua prisão.
Ao longo do todo o livro, o processo, Joseph é julgado, é acusado, tem testemunhas de acusação, mas nunca em momento algum ele sabe porquê ou o que terá feito. Joseph K nunca terá acesso ao processo ou saberá em que se fundamenta.

Contrata um advogado para o defender daquilo que ele não sabe, mas sem sucesso porque o advogado está desinteressado do seu caso. A dado momento chega a acreditar na sua culpa, que fez algo que não devia e que até merece o que lhe está acontecer.

No fim, Joseph K que lutou contra o desconhecido, contra os tentáculos do próprio tribunal, muitas das pessoas que ele contacta ao longo do livro acabam por estarem directa ou indirectamente associadas ao tribunal, é sentenciado e executado com uma faca enterrada no coração.
Ele está cansado e resignado. Está destruído. Desiste de lutar e aceita o seu destino oferecendo-se aos seus algozes.

A morte de Joseph K nestas condições choca-me porque ele morre no desconhecimento, mas também incomoda e causa ansiedade porque o livro ficou em aberto. Não tem fim. O fim natural do livro seria saber o que aconteceu a Joseph. O que obviamente é coisa que nunca saberemos.

Quando acabamos de ler O Processo há desconforto no nosso interior, um certo travo amargo na boca.
É fácil reconhecer o seu desespero. Os corredores infindos e inúteis da justiça, a burocracia sem fim e também ela inútil, o aparente desconhecimento do que se fala ou se quer falar com quem se fala, o esforço quase vão de lutar contra os entraves que sistema coloca à nossa frente.
Vamos perder tempo em ambientes pesados, sufocantes e claustrofóbicos, vamos enredar-nos em guichets impessoais de funcionários desinteressados, não vamos ter o nosso caso resolvido ou com sorte ficará mal resolvido.

Muitas serão as vezes em que desistiremos e tal como Joseph K seremos alienados e burocraticamente executados com o nosso consentimento.


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