sábado, 3 de maio de 2014

uma música para o fim de semana - Quinteto Hugo Alves


Humm... sábado. Esticado no sofá com a televisão desligada. Uma almofada sobre os olhos fechados.
Sentir o sossego do dia, da quietude da sala a fluir pelo corpo, pela alma.
Imaginar um quadro negro e escrever nele pequenas coisas que são importantes para nós. Coisas que nos fizeram, coisas que nós fizemos, onde fomos importantes para alguém, que ajudámos alguém.

Bons momentos, coisas que vimos ou que conseguimos fazer que nos marcaram, que marcaram positivamente alguém ou ajudara ou aliviara o sofrimento de um animal.
Sorrisos libertados, uma dor aliviada, uma esperança frágil que não se apaga, lágrimas soltas pela simplicidade do gesto que ajudou alguém, pela sua diferença positiva.

Nada de coisas grandiosas. Essas são das fáceis. São planeadas, são pensadas ao pormenor, com backups antecipados.
Eu gosto do pequeno. Aquelas cá de dentro, genuínos, feitas no momento, baseadas na surpresa do segundo sem alternativas pensadas e que quando por acaso até há uma inesperada, um golpe de rins, ela adiciona tempero à surpresa.
São aquelas que vão connosco, dentro de nós, para a vida, sem por vezes sabermos que são permanentes.
Aquelas que de vez em quando um flash de memória nos faz recordar que aconteceram e percebemos então que afinal não são passageiras em nós mas sim eternas.
São os pequenos momentos, os mais bonitos, os permanentes, os marcantes, os que vale a pena viver por nós e pelos outros, por muito breves (ou não) que sejam.

É isto que "Pequenos Momentos" do trompetista algarvio Hugo Alves e do seu quarteto - Pablo Romero no piano eléctrico, Rodrigo Monteiro no contrabaixo e Michael Lauren na bateria - nos tenta comunicar, ilustrar musicalmente.


Bom fim de semana e que os Pequenos Momentos abundem em vocês :)




quarta-feira, 30 de abril de 2014

dia mundial do Jazz II







Takin' Off editado pela Blue Note em 1962, foi o primeiro álbum em que o pianista Herbie Hancok surge como bandleader. 
É considerado um dos álbuns mais importantes de jazz de sempre e um dos mais bem sucedidos da história deste género musical para alguém que lança o seu primeiro trabalho.

Herbie Hancok rodeou-se do melhor que a Blue Note tinha para oferecer ao nível dos músicos. Era um quinteto de luxo.
Freddie Hubard no trompet, Dexter Gordon no saxofone tenor, Butch Warren no contrabaixo e Billy Higgins na bateria. Todos eles uns senhores nos seus instrumentos.

O tema que abre o álbum - Watermelon Man - tornou-se marcante e um standard quer na obra de Herbie Hancock quer no jazz que se fazia até ao momento.
Watermelon Man tem um estilo muito funky que de imediato capta a nossa atenção e nos cativa. O trompete de Freddie Hubard domina plenamente o tema em parceria com o piano de Herbie Hancock principalmente na sua fase final. É impossível escapar-lhe.
Com este álbum e logo o primeiro, Hancock dava sinais e apontaria já o caminho que ele (e Miles Davis) iria desbravar no jazz. 

Diz-se que este tema surgiu porque no bairro em que o pianista vivia, havia um senhor que vendia melancias descendo e subindo as ruas anunciando-se e apregoando sucessivamente Watermelon Man!!
Mais tarde Herbie Hancock haveria de compor este tema em sua memória.
Talvez seja verdade, talvez não. Mas não deixa de ter o quê :)

Herbie Hanconk, uma lenda viva do jazz, muito contribuiu para que fosse criado o dia mundial do Jazz.
É justo que seja ele a escolha para dar a cara e o tema seu Watermelon Man por este dia muito especial para mim.


Feliz dia mundial do Jazz, e ouçam, descubram e redescubram com prazer o jazz ;)





dia mundial do Jazz I



É tão simples gostar de jazz :)




terça-feira, 29 de abril de 2014

dia mundial da Dança





Dança. Talvez seja uma das artes mais completas que existem. 
Nela encontramos todas as outras. Movimento, emoção, cor, poesia, expressividade, teatralidade e música, mesmo quando não há música podemos vê-la através dos corpos que se movimentam no silêncio do espaço.

Na dança vemos corpos elegantemente esculpidos pelo esforço, pela rotina dos movimentos executados até ao infinito, o sacrifício que os despoja do supérfluo, assumindo apenas o essencial físico, até que a perfeição seja algo natural.

A companhia canadiana La La La Human Steps, sediada em Quebec exige e faz isto todos os dias ao seus bailarinos. É uma companhia extremamente física, ou não fosse de dança que estivéssemos a falar, e particularmente atlética.

Na coreografia Amelia de Édouard Lock, para além da maneira como esta está filmada, os cenários utilizados, os jogos de luz e sombras conseguidos, é absolutamente fascinante vê-los dançar.
Ou melhor, vê-la dançar, porque neste segmento vídeo da coreografia, a bailarina (Mistaya Hemingway) tem a parte de leão. A beleza, a elegância, a rapidez e a precisão de alta relojoaria dos seus movimentos é... estonteante.

Para quem quiser ver a continuação da coreografia pode ver aqui ou então a peça completa que aconselho vivamente, aqui.






domingo, 27 de abril de 2014

um poema de... Vasco Graça Moura (no dia da sua morte)


Regra geral quando morre alguém que admiro muito, seja de quem área for, exclamo "Que merda!"

Significa que é alguém que faz falta, que era alguém que tinha mais para dar, que era alguém que já tinha dado muito, que a sua perda foi inesperada e acima de tudo era alguém que tinha conquistado a minha admiração e até afecto.
Há poucos minutos soltei esta mesma exclamação. A morte de Vasco Graça Moura apanhou-me de surpresa. Não sabia que sofria "de doença prolongada", como quem diz à socapa, cancro.

Conhecia muito pouco o lado político - fundador do PSD, secretário de estado e eurodeputado durante dez anos - e profissional de (advogado) Vasco Graça Moura.
Mas tinha e tenho, uma profunda admiração por toda a sua (vasta) obra literária enquanto homem de letras em todas as suas vertentes: ensaísta, cronista, tradutor, antologista, escritor, poeta e crítico, sem esquecer todo o seu papel na gestão da cultura nomeadamente, enquanto director RTP, da Imprensa Nacional - Casa da Moeda. e recentemente director do Centro Cultural de Belém.

Entre muitos e variados prémios literários, foi vencedor do Prémio Pessoa em 1995 e Prémio Virgílio Ferreira em 2007.
Ainda em 2007 haveria de ganhar o Prémio de Tradução do Ministério da Cultura italiano pela excelência da sua tradução da Divina Comédia de Dante Alighieri.

Era abertamente um acérrimo crítico do acordo ortográfico.




Enquanto poeta Vasco Graça Moura, tenho um profundo carinho por O soneto do Amor e da Morte. É um dos poemas mais bonitos, doces e sentidos da sua poesia.
Já aqui antes tinha colocado este texto a propósito deste mesmo soneto.

Volto a ele de novo. Nunca é demais rever ou reler o que é bonito.
Espero e desejo que tenha sido assim os seus últimos momentos.

😢


soneto do amor e da morte 

quando eu morrer murmura esta canção
que escrevo para ti. quando eu morrer
fica junto de mim, não queiras ver
as aves pardas do anoitecer
a revoar na minha solidão.

quando eu morrer segura a minha mão,
põe os olhos nos meus se puder ser,
se inda neles a luz esmorecer,
e diz do nosso amor como se não

tivesse de acabar, sempre a doer,
sempre a doer de tanta perfeição
que ao deixar de bater-me o coração
fique por nós o teu inda a bater,
quando eu morrer segura a minha mão.

Vasco Graça Moura, in "Antologia dos Sessenta Anos"